HISTÓRIA DA BIOSSEGURANÇA

   A preocupação com o desenvolvimento das atividades biológicas que geram risco à saúde é uma característica antiga da humanidade. Desde 1665, quando Robert Hooke relatou ao mundo que as menores unidades vivas eram “pequenas caixas” ou “células”, como ele as chamou, a Ciência avançou enormemente na investigação dos mecanismos de geração e transmissão de várias doenças. Embora o microscópio de Hooke fosse capaz de mostrar células, o primeiro cientista a realmente observar microrganismos vivos através de lentes de aumento foi o alemão Antoni van Leewenhoek, descrevendo-os como “animálculos”. A partir de então, na medida do possível, muito se discutiu e pesquisou sobre os microrganismos, e, quase 200 anos depois dessa descoberta, rápidos avanços foram estabelecidos, entre os quais:
- Florence Nightingale (1863) reduziu a incidência da infecção hospitalar com medidas de higiene e limpeza;
- Lous Pasteur (1864) derrubou a teoria da geração espontânea e desenvolveu a técnica de pasteurização;
- Joseph Lister (1867) tratou os ferimentos cirúrgicos com fenol, reduzindo a infecção hospitalar;
- Robert Kock (1876) descreveu os postulados de Kock, demonstrando, pela primeira vez, que uma doença infecciosa específica é causada por um microrganismo específico.
   Nos últimos 40 anos, o advento da biotecnologia possibilitou ao homem o desenvolvimento de técnicas para a “construção” e o manuseio de organismos capazes de resistir aos tradicionais métodos químicos e físicos de controle do crescimento biológico. Deu-se início à era genética!
   A evolução dos conhecimentos científicos e tecnológicos, principalmente após a segunda metade do século passado, trouxe, destacadamente para as ciências biológicas, grandes avanços através do uso e aplicação na pesquisa e produção das técnicas da engenharia genética e da biologia molecular. A aplicação dessas técnicas levou, conseqüentemente à necessidade do debate de natureza ética e de biossegurança, temas fundamentais na área da saúde.
   A primeira discussão sobre os impactos da engenharia genética na sociedade ocorreu na década de 70 do século passado, na reunião de Asilomar, nos EUA, em que voluntariamente foram suspensos alguns experimentos relacionados com as alterações de microrganismos em pesquisas de doenças. Desde então, o conceito de biossegurança vem sendo cada vez mais difundido e valorizado na medida em que o entendimento da responsabilidade do profissional envolvido em atividades que manipulam agentes biológicos, microbiológicos, químicos, entre outros, não se limita ás ações de prevenção de riscos derivados de sua atividade específica, mas também do colega que labuta ao seu lado, do técnico que o auxilia e de outras pessoas que participam direta ou indiretamente desta atividade. Além disso, todo o meio ambiente que o circunda e a comunidade onde está localizada a instituição devem ser considerados espaços importantes a serem preservados e protegidos de ameaças e riscos.
   No Brasil, a primeira legislação que poderia ser classificada como de biossegurança foi a resolução nº 1 do Conselho Nacional de Saúde, de 13 de junho de 1998, a qual aprovou as normas de pesquisa em saúde. Mas a biossegurança surgiu com a força que se fazia necessária somente em 1995, com a Lei nº 8.974 e o Decreto nº 1.752, que regulamenta essa Lei, A partir de então, criou-se a Comissão Técnica e Nacional de Biossegurança (CNTBio), vinculada à Secretaria Executiva do Ministério da Ciência e Tecnologia.
   Responsável pela política nacional de biossegurança, a CTNBio propõe o Código de Ética de Manipulações Genéticas; estabelece os mecanismos de funcionamento das Comissões Internas de Biossegurança (CIBio) – a partir de agora, obrigatoriamente presente em qualquer instituição que se dedique ao ensino, pesquisa, desenvolvimento e utilização das técnicas de engenharia genética; emite Certificado de Qualidade em Biossegurança (CQB), referente às instalações destinadas a qualquer atividade ou projeto que envolva organismos geneticamente modificados (OGM) ou derivados; entre outras funções, que objetivam o crescimento, ordenado em pesquisas de qualidade no país. Como é possível verificar, a Lei nº 8.974 é limitada à manipulação de OGMs, mas através da Portaria nº 343/GM, de 19 de fevereiro de 2002, o então Ministro de Estado da Saúde, José Serra, instituiu, no âmbito do Ministério da Saúde, a Comissão de Biossegurança em Saúde. Esta Portaria visa, entre outras, atribuições, participar e acompanhar a elaboração e reformulação de normas de biossegurança bem como promover debates públicos sobre o tema. Ainda que seja instituída de forma bastante discreta, a criação da Comissão de Biossegurança em Saúde representa um passo importante para o início das atividades em biossegurança no âmbito da saúde, e não somente OGMs, como regulamenta a Lei nº 8.974.

Fonte: MASTROENI, M.F. Biossegurança Aplicada a Laboratórios e Serviços de Saúde.São Paulo: Editora Atheneu, 2004, p.1-2.